Para nós espíritas, ter fé não é simplesmente crer por ponto dogmático nesta ou naquela assertiva, sem apreciá-la criticamente à luz da razão e dos fatos. Mais do que “crer”, ter fé, para o Espiritismo, é “saber”. E para isso é preciso conhecer, ajuizar e decidir sobre o que de fato esclarece daquilo que subverte.
Se acreditamos em pontos como a reencarnação, é preciso mostrarmos as razões para isso. Não se trata apenas de uma crença intuitiva, própria do homem – embora a seja também e isso tenha desempenhado importante papel sobre o início das pesquisas sérias sobre o assunto – mas de uma hipótese científica muito respeitável (para dizer o mínimo), além de filosoficamente válida, tanto nas tradições orientais ou ocidentais, e de tese religiosa capaz de resolver problemas teológicos complicados, criados por deturpações intencionais de certas fontes, que levaram a abusos de toda ordem. Mas não falaremos de reencarnação. Pelo menos neste instante. Dei este exemplo unicamente para que fique claro que necessitamos de diretrizes claras e fontes confiáveis para assentarmos nossa ‘fé’ sobre terreno sólido. Porque mesmo que esse ameace tremer, a base firme se consolida ainda mais e revela-se uma fé ainda mais profunda, validada pela experiência pessoal no contato com o sagrado. Saber e sentir, duas faces da mesma moeda, a comporem o todo, o Self, em movimento inquietante sobre o que é verdadeiro e o que é próprio de sua Natureza.
E este movimento é o que poderíamos chamar da busca de Deus, a causa primária de todas as coisas. Os físicos buscam a partícula fundamental, os biólogos o primeiro aminoácido, os psicólogos as motivações de nossos atos, mas se todos achassem verdadeiramente o que procuram, teríamos apenas um retrato tímido do todo visto pelas partes ínfimas que o compõem, a refletirem direções infinitas, que não necessariamente convergem ao centro de ações daquela mesma causa primária de início buscada. O nosso alcance, portanto, para chegar a Deus, trafegando por uma estrada racional ainda tão esburacada, certamente trarpa problemas para chegarmos ao destino visado. Por isso o grau de plausibilidade de Deus é diferente para cada um, conquanto seja diferente o grau de intelectualidade de cada um, mas se tivermos claro o conceito de Deus como “causa primária”, tão magistralmente descrito no início do “Livro dos Espíritos”, não nos deixaremos cair em absurdos como um Deus antropomorfizado, vingativo, cruel, senhor de um Exército ou juiz inacessível de um trono a emitir sentenças irrevogáveis de danação ou salvação.
Podemos, numa experiência igualmente válida, de nosso próprio ser, acessa-lo pelo sentimento, pelo ‘coração’, confiando a Ele pensamentos e planos, comungando intimamente com a Divindade, que Jesus mesmo alertou estar dentro de nós. Ter fé em Deus, nesse sentido, expressa nossa capacidade em mais do que tudo, sermos honestos e abrirmo-nos conosco mesmo, para nos entregarmos, definitivamente, aos cuidados do Senhor. Não é à toa que encontramos nas diversas obras de André Luiz as passagens de aflição e combate dos Espíritos contra suas próprias naturezas e atitudes, que resolvido o impasse e havendo o interesse de serem ajudados, passam a “ter acesso” a Deus, após o processo de desbridamento de suas próprias chagas morais.
Ter fé em Deus, portanto, é entregar-se, sem se preocupar com o futuro, com o passado, com a tormenta ou com a bonança. É ser responsável e prevenido, mas feliz e cauto quanto às próprias possibilidades de erros, sabendo, humildemente, que humanos, erramos, mas basta uma palavra, um pensamento à Deus, e tudo estará salvo em porto seguro, em que novas chances de acerto e erro estarão sempre ao dispor de nosso livre-arbítrio, mas sempre forjando e aperfeiçoando o Espírito.
Essa experiência, profundamente pessoal, não pode ser transmitida a ninguém. É necessário experimenta-la, permitir-se a ela Procuramos Deus em toda parte, mas não vemos que está com a gente o tempo todo...